A crise do Estado é um componente importante da crise brasileira. Há uma percepção disseminada, na esquerda como na direita, de que o seu desenho não mais atende às necessidades do país. Para alguns, por ser demasiado pequeno e tímido: seria necessário ampliar o escopo e a intensidade da sua atuação, fazendo dele o grande motor da economia. Para outros, por ser demasiado grande: seria preciso reduzi-lo, "tirá-lo das costas do empresário", para que o setor privado promovesse o desenvolvimento por sua iniciativa espontânea.
São duas perspectivas simplistas que devem ser igualmente rejeitadas por quem compartilha de uma visão nacional e genuinamente desenvolvimentista. Por sermos simpáticos à atuação do Estado, corremos maior risco de nos deixar seduzir pela primeira. Por isso, é importante ter prudência e discernimento. Queremos um Estado forte, mas a nossa oposição ao liberalismo econômico não pode obliterar a nossa capacidade de perceber que Estado forte não é, de fato, sinônimo de Estado grande. Assim, nem toda iniciativa para tornar o Estado mais enxuto, menos custoso, deve ser rejeitada por nós como "liberal".
Camaradas bem-intencionados caem nesse equívoco com frequência, talvez movidos por uma certa reatividade irrefletida a tudo o que pareça liberalismo. O triste resultado desse engano é que os liberais acabam ganhando o monopólio do discurso em favor da eficiência e da austeridade -- valores que, convém ressaltar, não são ruins em si mesmos, pelo contrário. São verdadeiramente belos, morais, e devem ser cultivados por nós enquanto expressões públicas daquela disciplina, temperança e ordem que desejamos ver disseminadas por toda a sociedade.
Nossa batalha diz respeito às finalidades do Estado, não ao seu tamanho, que é uma consequência. Não devemos buscar um Estado pequeno, como se isso fosse uma qualidade, mas devemos buscar, sem dúvida, um Estado 'ascético', sempre pronto para descartar futilidades, cortar despesas desnecessárias e afastar demandas de interesses meramente grupais em prol de uma Razão nacional superior, que cabe a ele constantemente filtrar, interpretar e promover.
Tenhamos claro que o sucesso de qualquer política desenvolvimentista pressupõe um Estado ágil, proativo, com grande capacidade de investimento e inovação. O Estado brasileiro já deteve essas qualidades. É só por meio dessa 'ascese' permanente, da busca incessante por eficiência e higidez que ele será capaz de recuperá-las e mantê-las, capacitando-se, novamente, para liderar um processo robusto de desenvolvimento do país.
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