O BRASIL É MISCIGENADO E MESTIÇO PORQUE QUER E GOSTA
- André Luiz V.B.T. dos Reis
- há 4 dias
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Atualizado: há 2 horas
Foi publicada nessa semana* uma pesquisa de mapeamento genético realizada na USP. Os dados revelam que o Brasil é o país mais miscigenado do mundo. O genoma brasileiro tem quase 60% de herança europeia, 27% de africana e cerca de 13% indígena.
A miscigenação se espraia pelas populações de todo o território nacional, mas a europeia é mais marcante em Goiás e no Rio Grande do Sul; a africana em Minas Gerais e na costa que vai do Rio a Pernambuco; e a indígena cresce substancialmente na Região Norte.
A miscigenação só não ocorre em alguns grupos brasileiros oriundos do extremo-oriente, dando razão parcial ao estereótipo que se tinha na República Velha de que japoneses e similares se integrariam menos à miscigenação brazuca por causa de seus traços culturais marcadamente etnocêntricos e endogâmicos.
Evidente que, no que diz respeito à mestiçagem, ou seja, à síntese de elementos culturais — e não apenas físicos —, esses descendentes de japoneses, coreanos etc. se abrasileiraram também: o Brasil é uma ''máquina'' irresistível de desetnicização e de integração.
Como era de se esperar, a herança genética europeia é herdada principalmente (mais de 70%) dos cromossomos masculinos e as indígena e africana vêm majoritariamente (mais de 70%) dos femininos. Foi o suficiente para que os identitários negristas presentes na USP e também nas redações dos jornais e sites interpretassem o dado segundo seus dogmas segregacionistas importados dos EUA: o brasileiro é miscigenado, segundo dizem, por causa da violência sexual.
Essa tese foi, no entanto, derrubada por pesquisa do Datafolha divulgada em fins do ano passado (cujos resultados comentei em alguns textos). As entrevistas apontam que o brasileiro (91%) não tem problema para se relacionar, seja em amizades ou amorosamente, com indivíduos de cor ou raça diferentes, uma tendência que não muda quando se avalia o recorte de pretos (81% dizem que a cor da pele nunca interferiu no seus relacionamentos, sejam eles amorosos ou de amizade).
A maioria esmagadora dos entrevistados (77%) declara ter se relacionado amorosamente com pessoas de cor/raça diferente, uma proporção que não se altera substancialmente nos recortes de pardos/brancos/pretos. Mais ainda, dentre os brasileiros que já viveram em relações estáveis, a maioria casou ou morou junto com pessoas de cor/raça diferente da sua — 48% do total dos pardos, 44% dos brancos, 51% dos pretos.
Estes dados explicam também as respostas de caráter mais subjetivo, principalmente aqueles sobre preferência erótica: 40% dos entrevistados dizem não ter predileção racial na hora da atração sexual, 28% preferem os pardos, 20% os pretos e apenas 14% os brancos (essa questão podia ter respostas múltiplas, e daí que o resultado ultrapassa os 100%).
Dizendo de outra maneira, a libido brasileiro prefere a melanina. E isso inclui o recorte dos brancos, que têm proporção maior de pessoas com predileção por pardos (21%) do que por brancos (17%).
(Leiam o texto: https://disparada.com.br/datafolha-identitarismo-negrista/ )

A verdade é que a miscigenação brasileira teve início antes mesmo da colonização propriamente dita. Antes da Monarquia lusitana se decidir pela ocupação sistemática do território do atual Brasil, já existiam dinastias de mamelucos (caboclos) na costa, frutos de casamentos entre portugueses e tupis.
Não é acaso, tampouco, que o mapeamento genético indique que a miscigenação se acentuou especialmente durante o ''ciclo do ouro". O número de alforrias na América portuguesa sempre foi marcadamente maior do que em outras experiências coloniais e incidia principalmente sobre as mulheres. As libertas formavam famílias com pobres de todas as 'cores'. A sociedade mineira setecentista era miscigenada não por causa do estupro sistemático de escravizadas, mas por gosto (incentivado também pela escassez de brancas).
Ou seja, reduzir a miscigenação brasileira a um fenômeno sistemático de violência sexual não passa de baboseira.
Não nego a existência de violência durante a Era Colonial, especialmente contra indígenas e escravizados. Mas ela está longe, muito longe, de ser o fator determinante para elucidar o caráter integrador do Brasil. Afinal, a violência esteve presente também na colonização anglo-saxã com resultados muito diferentes quanto à mestiçagem, sincretismo, miscigenação e inclusão étnico-racial.
Afirmar que se tratam apenas de ''modelos'' diversos de violência é concluir, de modo absurdo, que tanto faz uma sociedade integracionista ou segregacionista, que ambas tratam com a mesma virulência e tolerância a questão étnico-racial, que ambas têm a mesma capacidade e potencial de convivência e integração dos diferentes.
Os dogmas do identitarismo negrista foram elaborados em uma sociedade bem diferente da nossa. Os EUA nasceram e se desenvolveram de modo segregacionista. A aplicação das teses esquerdistas norte-americanas a um país que se originou em parâmetros sócio-culturais fundamentalmente diversos não passa de outro capítulo da cegueira das elites para nossas singularidades.
Enquanto militantes negristas dominam a mídia e as universidades e os transformam em palanque para divulgação de ideologias alienígenas que moldam leis e instituições a partir de critérios bi-raciais e segregacionistas, o brasileiro comum continua, um século e meio depois do fim do escravismo, fazendo amizades, namorando e casando sem qualquer exclusivismo racial.
O Brasil é miscigenado e mestiço porque quer e porque gosta.
*Meados do mês de maio
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