É uma pena que o desenvolvimento do paladar esteja associado com um certo tipo de esnobismo e com atividades das elites financeiras (aquelas que comem patê de fígado de ganso levantando o dedo mindinho e fazendo beiço). O paladar é um dos sentidos humanos mais misteriosos e complexos porque não há uma maneira uniforme de torná-lo mais refinado - um treinamento senso estrito - e o próprio conceito de "elevar o paladar" passa por uma série de problemas antropológicos e culturais. A história do gosto, inclusive, nos mostra que as modulações perceptuais das iguarias podem correr paralelamente ao processo histórico dos povos.
Segundo Gilberto Freyre e Câmara Cascudo, o Brasil é um país com um alto desenvolvimento do "paladar doce". Isso se deve a dois fatores:
Cultura do açúcar;
Cultivo diversificado e fácil adaptação de frutas exóticas.
O problema é que a ascensão do "leite condensado", e, hodiernamente, da revoltante "Nutella", padronizou todas as sobremesas, acepipes e quitutes numa forma grosseira do "quanto mais doce melhor". A cocada, por exemplo, que era apenas coco, água e açúcar - com variações de queima e outras licenças poéticas - agora é apenas um bolo de leite condensado com raspas de coco.
Eu tento fugir dessa explicação, mas não há como deixar de pensar que a indústria dos alimentos é que vendeu a ideia de tornar tudo mais fácil com produtos que carregam uma quantidade gigantesca de açúcar e que, portanto, viciam e embrutecem o paladar (sem falar nos prejuízos à cultura alimentar e à saúde).
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