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A Seleção da França é francesa



O que Mbappé, Zidane, Platini e Just Fontaine têm em comum?


A seleção francesa causa um debate recorrente por ser formada por filhos de imigrantes. Alguns chegam a negar a identidade nacional dos principais jogadores, chamando a equipe de "francófona". Estranhamente, as críticas se focam nos jogadores negros e mulatos da equipe, ainda que os brancos também tenham ascendência fora da França.


Qual a pertinência e a justeza da crítica segundo uma perspectiva brasileira?


Para definir a cidadania, os brasileiros usamos o Jus Solis ['direito de solo'], e não o Jus Sanguinis ['direito de sangue']. Ou seja, por princípio, é considerado brasileiro todo aquele nascido em nosso território, independente de sua ancestralidade. Se dois argentinos tem um filho no Amapá, o filho tem direito à cidadania brasileira. Se dois moçambicanos tem um filho no Rio de Janeiro, igualmente. Se dois árabes tem filho em São Paulo, mais um brasileiro no Universo.


Vejamos então os atletas da atual seleção francesa que são filhos de imigrantes de primeira geração.


a. Lloris: Sua mãe é francesa, seu pai é um banqueiro de Monte-Carlo e que tem ascendência espanhola. Ele nasceu em Nice, e pelo Jus Solis é francês.


b. Koundé: originalmente um zagueiro, está jogando de lateral direito. Sua família tem ancestralidade também em Benim. Mas ele nasceu em Paris. Pela perspectiva brasileira é francês de corpo e alma.


c. Varane: o zagueiro é mulato com pai de Martinica e mãe francesa. Nasceu em Lile, França. Logo, é francês.


d. Upamecano: Sua família vem de Guiné Bissau, e ele cresceu em bairros de imigrantes. Nasceu em Évreux, França. Logo, é francês.


e. Théo Hernadez: O lateral esquerdo, cujo irmão era o titular até o primeiro jogo do Mundial, também tem ascendência espanhola. Nasceu em Marselha. Ele é francês.


f. Tchouameni: O volante tem ascendência camaronesa. Nasceu em Rouen e foi criado em Bordeaux. Francês, claro.


g. Griezmann : Branco, também não está na principal mira de parte dos críticos. Sua família tem ascendência germânica, e ele nasceu na comuna de Mâcon. Portanto, é francês.


h. Dembelé: Pai veio de Mali, mãe de Senegal. Ele nasceu em Vernon, em plena Normandia. Logo, é francês.


k. Giroud: Filho de imigrantes de segunda geração, seus avós eram italianos. Ele nasceu em Chambéry, França, e é francês evidentemente.


l. Mbappé: O pai é camaronês e a mãe vem da Argélia. Ele nasceu e foi criado em Paris. É francês.


Não tem sentido criticar essas pessoas por terem identidade nacional francesa, porque eles são tão franceses quanto os brasileiros são brasileiros, ainda que tenhamos também ascendência fora do país [angolanos, portugueses, nigerianos, italianos, espanhóis, sírios etc.].

O que devemos criticar é a política deliberada francesa e europeia de vampirizar continentes e regiões pobres, e de forma ainda mais específica ex-colônias -- Camarões, Argélia, Mali, Senegal etc.


A França e outros países europeus usam a desproporção de poder no sistema internacional de nações e adotam uma política agressiva de imigração com o intuito de sugar cérebros e talentos. O Canadá também montou sua seleção a partir desta prática, mas com foco, principalmente, na América Central. É uma forma de neocolonialismo.


A FIFA deveria coibir também a naturalização de esportistas, como a que aconteceu com Embolo, da Suíça. Neste caso, não se trata de filho de imigrantes nascido no país, mas de uma prática pra lá de condenável. Nós também cometemos essa barbaridade nas Olimpíadas do Rio, naturalizando atletas para jogarem com nossas cores no Handebol e outros esportes, mesmo que não fossem nascidos no país e não tivessem vínculos sólidos com o Brasil.


Nem todo país vincula nacionalidade à ancestralidade ['direito de sangue']. A nossa se fundamenta no 'direito de solo', então não tem sentido um brasileiro criticar os franceses por eles não praticarem o Jus Sanguinis. É possível também denunciar a instrumentalização da seleção francesa, construída em laços neocoloniais, para propagandear a nova sociedade globalista cosmopolita e calcada em critérios individualistas e contratuais.


Mas Mbappé é tão francês quanto Zidane, Platini e Just Fontaine.


Zidane tinha pais argelinos, mas nasceu em Marselha. Platini tinha pais italianos, mas nasceu em Jœuf. Just Fontaine era filho de espanhóis, nascido em Marraqueche, no Marrocos, em um momento em que se tratava de uma colônia francesa. Todos franceses. E assim como toda a França [católica ou pagã, rural ou urbana, branca ou mulata], frutos do imperialismo europeu.

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