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Foto do escritorAndré Luiz V.B.T. dos Reis

O PACOTÃO DO NOVO FERNANDO, ou: As Bodas de Ouro entre o petismo e o neoliberalismo

"Se dali a dois, três meses, nós identificarmos riscos, trajetória, nós vamos ter que parar essa trajetória para verificar qual é, voltar para a mesa, ser feitos os ajustes que terão que ser feitos para manter essa trajetória" Fernando Haddad prometendo novos ajustes fiscais caso necessário
Haddad
Haddad

O governo do PT ("Partido dos Trabalhadores") se aproveitou do estado quase hipnótico em que a sociedade entrou por causa da divulgação do relatório da Polícia Federal (com fartos indícios da conspiração golpista liderada por Bolsonaro) para propor ao país um pacote de cortes de gastos. O pacote está sendo vendido como solução para a suposta situação fiscal periclitante do Estado. As propostas afetam diretamente os mais pobres, ao mudarem o cálculo de valorização do salário mínimo e a concessão de abono salarial. Além disso, empurram para o Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) as contas da expansão do ensino integral e do Programa Pé de Meia (um incentivo financeiro a estudantes). Isso significa, no fim das contas, uma asfixia gradual do Orçamento da Educação.


Boa parte da esquerda lulopetista aplaudiu efusivamente o pacotão, preferindo olhar para as novas regras da Previdência Militar e as promessas de taxação de super-salários e de isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil reais mensais. E nisto estão de acordo com as principais vozes do ''mercado'' que, embora pontuem que o ajuste do Ministro Fernando Haddad [supostamente] é ''tímido'' diante das ''necessidades'' do país, o consideram um movimento na direção correta e suficiente para indicar medidas ainda mais radicais no futuro próximo. 


''A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) divulgou nota nesta quinta-feira 28 em que destaca que as iniciativas do pacote fiscal, anunciadas pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, estão “na direção certa”, apesar de destacar a “criticidade do quadro fiscal” e acenar para um ajuste “mais forte” no futuro. Entre as medidas citadas pela federação estão limitação no reajuste do salário mínimo, mudanças do abono salarial e do BPC (Benefício de Prestação Continuada) e as novas regras de concessão e acompanhamento do Bolsa Família. “Importantes medidas na busca da contenção de gastos”, afirmou a federação.'' [Fonte: 'Está na direção certa', diz Febraban]


Desde a campanha presidencial de 2018 (quando o candidato Jair Bolsonaro foi eleito Presidente da República, vencendo Fernando Haddad) eu me refiro a Haddad como o ''novo Fernandinho'' para apontar suas similaridades fundamentais com os Presidentes neoliberais Fernando Collor de Mello e, principalmente, Fernando Henrique Cardoso, que consolidaram a submissão macroeconômica da Nova República ao neoliberalismo. No caso de Cardoso, os vínculos são ainda mais poderosos, já que ambos (Haddad e Cardoso) têm em comum uma mentalidade e ideologia moldadas pelo uspianismo e pelo nexo de poder que se desenvolve em torno da metrópole paulista, características que denomino há anos de ''paulistocentrismo''. Isso revela a filiação do regime atual com movimentos oriundos da Velha República derrotada por Getúlio Vargas anos anos 1930. 


Collor
Fernando Henrique Cardoso

Haddad e Lula
Haddad e Lula

A avaliação de que faço de Haddad não se dá à toa. Em 2019, o ex-Prefeito de São Paulo se referiu à Era Vargas como um "crescimentismo" que não poderia ser comparado ao real desenvolvimento que os dois primeiros mandatos de Lula trouxeram ao Brasil, uma declaração risível e que comentei com maiores detalhes no texto O inimigo de Fernando Haddad é Getúlio Vargas (clique para ler).


Em 2018, publiquei um texto nas minhas redes sociais apresentando 12 pontos que seria motivos pelos quais um trabalhista não deveria de forma alguma votar no novo Fernando, então candidato do PT à Presidência da República. Dizia eu que "Haddad é um liberal progressista que vai colocar Marcos Lisboa, que é como se fosse um Meirelles ou Armínio Fraga da vida, no comando da economia brasileira. Nesse momento mesmo ele já começou a conversar com as forças do mercado. Vai praticar um novo ''estelionato eleitoral'', como aquele cometido por Dilma", e acrescentei que ele era "a síntese acabada do globalismo: neoliberalismo, sensibilidades liberal-burguesas e cosmopolitismo pós-moderno" e "a cara da continuidade do sistema político-partidário paulistocêntrico que oprime o país há vinte e cinco anos. Ele vem realizando alianças com grande parte das forças que anteontem o PT denunciava como golpistas." [Fonte: Porque não votar em Haddad]


A atuação do novo Fernando no Ministério da Economia é a confirmação exata destes diagnósticos. A aliança de Haddad com a Febraban e as vozes do rentismo não foi expressa no pacotão deste mês, que existe apenas em função do Arcabouço Fiscal que o governo Lula costurou logo após sua vitória eleitoral para substituir o desmoralizado Teto de Gastos de Temer (que não foi cumprido por Bolsonaro em nenhum ano de seu governo). O Governo Lula chamou para si a responsabilidade de estabelecer uma âncora fiscal eficiente o suficiente para realizar o sonho explícito dos neoliberais, dos rentistas, da Faria Lima e de todos os anti-getulistas: destruir gradualmente o Estado.


Fernando Henrique Cardoso e Fernando Haddad
Fernando Henrique Cardoso e Fernando Haddad

Lula foi eleito prometendo colocar abaixo o Teto de Gastos, e dispunha de condições políticas para realizar tal feito, principalmente depois da união entre mídia e sistema partidário gerada pela tentativa mambembe de golpe em janeiro de 2023. Mas preferiu amarrar o país em uma regra fiscal tão ou mais rígida, provando mais uma vez o acerto de Leonel Brizola ao dizer que os petistas "cacarejam para a esquerda e colocam ovos para a direita". Em março daquele mesmo ano (2023), o novo Fernando dizia cinicamente que seu novo Teto de Gastos era passível de ser defendida tanto por liberais quanto pela centro-esquerda - como se houvesse qualquer diferença macro-econômica entre os dois campos!


A vocação perene do PT sempre foi se fingir contrário ao "neoliberalismo" só para decapitar de vez todas as esperanças do nacionalismo popular. O Arcabouço Fiscal de Haddad foi a pá de cal na expectativa de um modelo de crescimento pautado e planejado pelo investimento público e na expectativa de uma readequação das estatais a um novo projeto de desenvolvimento. Lula tinha tudo nas mãos para atacar o rentismo instuticionalizado alegando 'combate ao bolsonarismo'. Porém, em vez disso, reforçou ainda mais o poder da Faria Lima, para surpresa de quase ninguém livre das técnicas hipnóticas do lulopetismo.


Quanto mais tempo permanecer no poder, mais espaço o PT terá para governar voltado para a Faria Lima do modo mais seguro possível: fingindo que faz tudo isso em nome dos trabalhadores. O neoliberal Paulo Guedes, ex-Ministro da Fazendo de Bolsonaro, sonhava em destruir qualquer sinal de Estado de Bem Estar Social e de direitos sociais no país. Delirava feliz ao falar do fim da Previdência, da doação das estatais, da entrega dos recursos naturais para multinacionais, da extinção de direitos trabalhistas, e da destruição dos Pisos Constitucionais da Saúde e da Educação. Mal sabia ele que estaria mais próximo de concretizar isso se votasse em Haddad já em 2018.

Haddad e Paulo Guedes, Ministro da Economia de Bolsonaro
Haddad e Paulo Guedes, Ministro da Economia de Bolsonaro

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