top of page

As oportunidades do ataque de Trump para o Brasil

Uma das vantagens dessa briga com Trump é o brasileiro comum perceber "na pele", ainda que em grau pequeno, a ingerência direta norte-americana em outros países quando se trata de defender mínimos interesses.


É o tipo de coisa que, se bem trabalhada, pode mudar completamente a perspectiva que algumas pessoas tinham das relações internacionais e do significado, na prática, de viver sob o "guarda-chuva" ianque.


Outro bônus é a reação causada na população em torno da ideia de nação. De repente, até mesmo certos intelectuais de esquerda notaram que vivemos em um mundo dominado por Estados-Nacionais e que a principal forma de sobreviver nele é aderindo a uma identidade nacional. A mesma identidade que boa parte desses intelectuais trabalha dia e noite para minar, na vã ilusão de que são "cidadãos do mundo".


O brasileiro também vai perceber que os EUA não são o Deus todo-poderoso. Há interdependências econômicas que causam prejuízos mútuos em uma refrega como essa. Diferente de Cuba, ou da tão ultrajada Venezuela, o Brasil é um país de economia gigantesca, razoavelmente sofisticada, com um imenso mercado interno, e recursos abundantes e diversificados. A economia brasileira não vai ser sufocada só por causa de um aumento de tarifas. Há problemas específicos, principalmente quanto a Embraer, que vão exigir medidas de apoio governamental também específicas.



ree


Mesmo as notícias escalafobéticas vendidas por Eduardo Bolsonaro, como a de que os EUA poderiam cortar até mesmo o sinal de GPS -- um cenário na prática quase impossível de acontecer --, só vão prestar para informar aos brasileiros que existem outros sistemas de navegação operando normalmente no país (Galileo, Glonass, Beidou) e que o GPS só é preferido por questões comerciais. Se o sinal norte-americano fosse bloqueado, até mesmo o google maps do celular do brasileiro comum já conectaria imediatamente em outro sistema de navegação. Caso os EUA chegassem a esse ponto — e não vão chegar nem de longe —, o maior impacto seria neles, que perderiam centenas de bilhões de merréis.


Enfrentamentos assim são oportunidades de que o povo se conscientize que boa parte da nossa alegada "dependência" é auto-imposta. Uma parcela imensa da população se acostumou a pensar que se o Uber fosse embora do país por se recusar a se submeter à legislação trabalhista, então os carros de aplicativo acabariam entre nós. Isso é uma fantasia nonsense.


Apesar dos danos momentâneos que uma disputa comercial com os EUA podem causar, eu até torço para que a escalada continue nas próximas semanas. Só pra ver o brasileiro entender que existem medidas brasileiras que poderiam doer MUITO nos bolsos ianques, como a quebra de patentes de remédios, ou a limitação da remessa de lucros de multinacionais.


Duvido que chegue a esse ponto: Lula é, no fundo, um neoliberal que acredita nas vantagens da abertura comercial. E o modus operandi trumpista é falar grosso o máximo possível mas retornar às mesas de negociação quando nota que a histeria não teve o efeito desejado. E, no fundo, os EUA não gostam nem precisam de Bolsonaro. Como eu disse antes, a família está sendo usada para que os EUA negociem tarifas em relação ao Brasil. É como os Bolsonaro se fizessem de aríete para que os ianques investissem contra a nossa economia.


Mas o protecionismo ianque aumentaria de qualquer maneira, e o Brasil tem de seguir o caminho que o restante do mundo tarifado pelos EUA está fazendo (o que inclui Canadá e União Europeia), que é diversificar os parceiros comerciais, buscar novas áreas de troca até então sub-exploradas etc.


Quem sabe poderemos também, em um futuro breve, abandonar o dogma liberal do livre-comércio. Mas aí já é sonhar demais, principalmente em uma situação vexaminosa em que parte considerável da população torce para que o país sofra sanções de um país estrangeiro. Além disso, a burguesia industrial brasileira não é confiável.

Comentários


© 2025 por Sol da Pátria.

bottom of page