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A REPÚBLICA ANTI-POVO - ainda sobre o 15 de novembro


Proclamação da República
Proclamação da República

 "[A Guarda Negra] se vinculava a compromissos solenes e graves rituais, o que lhe dava aparência de Maçonaria Negra; as sessões eram rigorosamente secretas, os iniciados contraíam juramentos sagrados, entre os quais o de guardar absoluto sigilo sobre as deliberações da casa. A violação dos segredos podia acarretar até a pena de morte [...]. Ao entrar para a milícia, cada um deles, de joelhos e com a mão sobre os Evangelhos, fazia o seguinte juramento: "Pelo sangue de minhas veias, pela felicidade dos meus filhos, pela honra de minha mãe e a pureza de minhas irmãs, e, sobretudo, por este Cristo, que tem séculos, juro defender o trono de Isabel, a Redentora. Em qualquer parte que os meus irmãos me encontrarem, digam apenas - Isabel, a Redentora - porque essas palavras obrigar-me-ão a esquecer a família e tudo que me é caro".'

Orico, Osvaldo. O Tigre da Abolição

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O Isabelismo era um verdadeiro culto secreto de negros e abolicionistas monarquistas, como José do Patrocínio, à Princesa Isabel, a Redentora
O Isabelismo era um verdadeiro culto secreto de negros e abolicionistas monarquistas, como José do Patrocínio, à Princesa Isabel, a Redentora

A República brasileira foi fundada por um conluio entre elites provinciais que desejavam se livrar dos traços unitários do Estado, pela ascensão dos cafeicultores paulistas incomodados com a falta de poder em um Império centralizado em torno do Rio de Janeiro, por militares ressentidos pelo civilismo e por sua decadência social, e por uma elite que rompeu com a Família Real por temor do projeto abolicionista.


Os republicanos se fiavam fanaticamente em ideologias racistas que implicavam na repressão a manifestações culturais populares, consideradas "selvagens" e incompatíveis com a única civilização possível (para eles), ou seja, aquela difundida pelos grandes centros liberais e capitalistas europeus e norte-americanos. Não se tratava apenas de marginalização da cultura, mas também de uma tentativa canhestra e até risível de ''embranquecimento'' e de reformas urbanas para que ficássemos mais parecidos com Paris e Berlim.


Podemos exemplificar essa sanha colonialista com as reformas urbanas no Rio de Janeiro, capital do país e até então nossa única metrópole, que expulsou os pobres para bairros distantes e impulsionou o processo de favelização. E a perseguição ao samba, o ataque a terreiros de omolokôs e candomblés, a tentativa de importar um modelo de Carnaval direto de Veneza.


O golpe militar de Deodoro da Fonseca inaugurou uma República disfuncional e sem povo
O golpe militar de Deodoro da Fonseca inaugurou uma República disfuncional e sem povo

A República nasceu atacando a religiosidade popular. Apesar do papel da Igreja no fim da Monarquia, o catolicismo-romano foi simplesmente ignorado, a separação entre o Estado e um dos marcos mais óbvios de identidade e unidade nacional foi quase que total. Os Estados Unidos do Brasil comemoravam como feriado nacional a queda da Bastilha mas não o Natal ou a Paixão de Cristo. Sempre que considerou necessário, os republicanos partiram para o genocídio, convictos de que desse modo confirmariam sua lealdade aos princípios da civilização iluminista europeia. Foi assim em Canudos e no Contestado, por exemplo.


Bandeira do Governo Provisório dos Estados Unidos do Brasil (15 de novembro de 1889 - 19 de novembro de 1889)
Bandeira do Governo Provisório dos Estados Unidos do Brasil (15 de novembro de 1889 - 19 de novembro de 1889)

A rejeição ao Imperador deixou um buraco no peito da nação, como é o caso da abolição do Poder Moderador. Que sumiu do arcabouço jurídico, mas permaneceu na cultura e no imaginário ao ponto de ser disputado ainda hoje, mais de 130 anos depois do golpe militar que, diante do Senado Imperial, conspurcou o Campo da Aclamação. Chega a ser irônico que a República, filha do golpismo de Generais, fique assoberbada pela perene reivindicação do Exército de ocupar o lugar deixado pelo Imperador. Não só os militares, mas outras corporações ligadas à alta classe média decadente, e mais adequadas ao espírito do tempo, como é o caso da atual juristocracia, iniciada na Operação Lava-Jato e na República de Curitiba, e que culminou na atual Democracia Militante de Alexandre de Moraes e cia.


13 de maio de 1888
13 de maio de 1888

Faltou dignidade à República até no tratamento devido à Família Imperial deposta do poder. As elites racistas, colonialista e golpistas que consolidaram o novo regime não tiveram sequer a decência de homenagear Dom Pedro II em sua morte, preferindo ignorar o evento, e até mesmo abafá-lo, para não despertar as paixões populares, já que a população era majoritaria e esmagadoramente monarquista. Coube a um governo estrangeiro, o francês, realizar as honras que o Monarca, enterrado com uma urna contendo terra de todas as províncias brasileiras, fazia por merecer.


Até hoje os republicanos se esforçam para distorcer e borrar a memória da Princesa Isabel, herdeira do Trono, como se fosse pouco assinar a Lei Áurea sem indenização aos grandes fazendeiros que formavam o grosso da elite social e política, e que se sentiram todos muito republicanos depois da Abolição da escravatura. Cabe lembrar que a imagem de Redentora associada à Princesa Isabel era divulgada por alguns dos principais líderes do movimento abolicionista, alguns deles negros, como José do Patrocínio, e pela Guarda Negra de capoeiras que se via na missão de combater os republicanos, que eles viam como uma reação à emancipação.


Morte e funeral de Dom Pedro II, na França
Morte e funeral de Dom Pedro II, na França

Essa República do Brasil oficial, como a chamaria Ariano Suassuna, é disfuncional e odeia o próprio povo. Seus defeitos continuam rigorosamente os mesmos, com uma intelectualidade alienada que não se cansa de imitar as modas do Norte Geopolítico, em relação ao qual tem um sentimento de pertencimento que beira o patético, e a incapacidade paralisante de lidar com os valores e os horizontes culturais da própria população. Não vou nem falar do ódio à religiosidade, do papel das corporações do Estado disputando o Poder Moderador, da persistente desigualdade social, do sentimento anti-povo de parasitas doidos para colaborar com a espoliação estrangeira.


A República brasileira parece ter o objetivo de confirmar o ditado popular de que ''pau que nasce torto, morre torto''. E por isso as comemorações do 15 de novembro tem sido bem pequenas. O povo não está nem aí em 2024, como também não estava em 1889. Talvez Dom Pedro II tenha cometido seu maior erro político ao não atender o pedido de Tamandaré e permitido que a Marinha falasse grosso com os golpistas.


Proclamação da República
Proclamação da República

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